• 8 de outubro de 2024
  • Market: Fertilizers

Falando de mercado: Oportunidades e tendências para o mercado brasileiro de fertilizantes

O mercado de fertilizantes segue gerando dúvidas e preocupações por toda a cadeia de distribuição de insumos. Buscando entender melhor os próximos passos, além de validar percepções de fundamentos, participantes do mercado brasileiro de adubos se reúnem para discutir oportunidades, novas fronteiras e tecnologias.

A repórter de fertilizantes da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes, Gisele Augusto, conversa com Ricardo Tortorella, diretor executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos, a Anda, sobre os tópicos discutidos no 11º Congresso, além de perspectivas e o sobre o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF).

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Transcript

GA: Olá e bem-vindos ao ‘Falando de Mercado’ – uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Meu nome é Gisele Augusto, repórter da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes, e converso com Ricardo Tortorella, diretor-executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA) sobre os principais tópicos discutidos durante o 11º Congresso Brasileiro de Fertilizantes, realizado pela Anda. Olá, Tortorella, é um prazer recebê-lo no Falando de Mercado.

RT: Prazer enorme estar com vocês, Gisele.

GA: Tortorella, vamos começar por um balanço sobre como foi o Congresso da Anda, que aconteceu em 27 de agosto, em São Paulo. Quais foram os principais destaques do evento?

RT: Bom, eu acho que tem bastante coisa para a gente falar, Gisele. A primeira delas é assim, é, é, muita gente passou por lá mais de mil pessoas presentes ao longo do evento, 3.000-4.000 pessoas assistiram online, não param de assistir, continuam assistindo isso e a gente espera que a mesmo nos próximos meses quem não teve oportunidade de lá estar busque este conhecimento e é muito interessante esse indicador sobre o aspecto seguinte: As pessoas estão buscando conhecimento. Nós dividimos nosso Congresso deste ano em quatro grandes módulos, quatro grandes painéis, os temas foram tratados por pessoas do mais alto calibre. Eu acho, resumidamente, que o conteúdo atendeu bastante àqueles que conosco estiveram, era exatamente o que as pessoas desejavam ouvir.

GA: Em termos de entregas, no evento as estimativas apresentadas durante alguns painéis variaram entre cerca de 45,5 e 46,5 milhões de t de fertilizantes. Qual a visão da Anda sobre as compras de fertilizantes para a safrinha, o mercado está demonstrando sinais de movimentação ou as compras devem ser postergadas para o início de 2025?

RT: É Gisele, acho que é assim, né? Os grandes consultores do mercado passaram pelo nosso é Congresso. Obviamente, a Anda não faz previsão a Anda está escutando isso. E se a gente fizer um resumo do que esses consultores disseram, tem um certo consenso de que nós vamos entregar algo entre 45,7 e 46 milhões de t. A consonância do mercado sinaliza esses números, seria o apurado. Mas o que importa é assim, a Anda está divulgando os dados de janeiro a junho e isso sinaliza as entregas até que até agora, exatamente isso, que a gente viveu do produtor agrícola um freio de mão um pouquinho puxado. Os preços caindo, rentabilidade dele caindo, taxa de juros cara, crédito difícil e é soberana decisão dele de compras, natural que ele tenha postergado essa decisão de compras. Mesmo assim, a gente está entregando 1,8pc abaixo do ano passado. O que quer dizer e como deve ser lido isso? De um lado, no ano passado nós tivemos safra de grãos, 325 milhões de t e neste ano, a expectativa da Conab é de 299 milhões de t de grãos. Então é super natural esse 1,8pc, e olhando o que neste período do primeiro semestre, que expressa esse número, esse produtor estava com o freio de mão puxado dos dois lados: ou esperando a melhor rentabilidade na venda do seu produto ou esperando uma queda de insumos. E como é, vocês bem sabem, é muito importante essa coisa dos preços nesse momento.  Eles foram variáveis, né?

E eu diria até a rentabilidade é se caiu de um lado, a relação de trocas do outro lado - que é sim, é uma das formas de olhar a moeda de troca do produtor rural - ele teve relação de troca favorável.

Nós tivemos no globo terrestre também, o preço do potássio deu uma segurada e permitiu uma relação de troca favorável para o produtor rural. E isso deu uma sequência para falar: está igual ao ano passado a expectativa de entrega.

GA: O ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues foi homenageado durante o Congresso da Anda e reforçou a importância dos fertilizantes para enfrentar o que chamou de "quatro cavaleiros do apocalipse" - segurança alimentar, segurança energética, mudanças climáticas e desigualdade social. Como o Plano Nacional de Fertilizantes está se desenvolvendo, na visão da Anda, para ajudar a enfrentar esses quatro cavaleiros do apocalipse?

RT: É bem legal esse desafio que o Roberto faz para todos nós, porque é exatamente isso, não é? Quer dizer, eu diria assim, o agro brasileiro é de fato, é a solução para os três maiores problemas da humanidade: então alimento, produção de alimentos, segurança alimentar, garantir que haja isso é o agro brasileiro, e fertilizante tem um papel importante nisso. A segunda coisa: meio ambiente, é meio ambiente, nós estamos vivendo aí. Esse período de seca, queimada, o Brasil está se se vendo queimar de um lado, mas ele viu também há 2-3 meses atrás chuvas no Rio Grande do Sul, que inundaram uma comunidade, então essa coisa da mudança climática é muito séria. E o mundo tem que estar atento a isso. E, de novo, a gente pode falar - o agro é solução para isso, sem desmatar nenhuma árvore, nós também ouvimos do ministro Fávaro, e que é uma grande verdade, o estudo feito conjuntamente com a Embrapa, com a ciência dizendo o seguinte: que nós sim, podemos ingressar na área plantada mais 4 milhões de hectares por ano na próxima década, que é a tal da agricultura regenerativa. Então isso a gente pode, isso é a ciência dizendo e, de novo, o agro pode ocupar esse espaço e ser solução para o Brasil plantar mais e melhor, respeitando o meio ambiente, transição energética e cuidando e produzindo mais alimentos. Tudo o que a humanidade precisa nós somos a resposta e tudo isso que o agro faz depende do fertilizante. Essa correlação é bastante saudável, interessante sobre o aspecto de a gente enxergar o Brasil como o país da solução dos problemas globais.

GA: Aproveitando para entrar na vertente do Plano Nacional de Fertilizantes. Quais os principais projetos já em desenvolvimento do Plano?

RT: Acho que tem duas coisas, Gisele, muito importantes no plano nacional de fertilizantes. Primeiro, eu queria comentar com você dizendo o óbvio, ele foi muito bem desenhado. É um plano bom, muito bem planejado, mas por ora é um plano, então nós temos que deixar de ser um plano e tornar isso uma execução. E aí, nós todos ligados ao fertilizante, mas nós todos do agronegócio, nós todos da sociedade brasileira, porque isso é importante para o Brasil. Então, se a gente quer dar um up, nós temos que é praticá-lo e o mais rápido possível. Então que isso seja uma prioridade e que a gente pratique isso o mais rápido possível. Acho que na última reunião do Confert, o conselho que toma conta dos fertilizantes, dois passos concretos foram dados. Primeiro, que se definiu os critérios que se hierarquiza a carteira de projetos e, segundo, que se definiu a primeira rodada da carteira de projetos. Os projetos ali elencados vão ser reconhecidos como a prioridade do governo para buscar soluções para que eles andem mais rápido. E nesses projetos, nessa primeira rodada de carteira, grosso modo, nós temos 60 projetos, que de algum jeito, podem ser acelerados, podem e devem ser acelerados, a maioria deles, por exemplo, só para dar um exemplo para o ouvinte, de licença ambiental, que está lá há muito tempo, é natural e é normal nós, como sociedade, como brasileiro, queremos preservar o meio ambiente e entendemos, sim, que mineração é uma coisa complexa e, portanto, precisa ser analisado e cumprido todo o check-list. Agora, ser cumprido o check-list dentro dos prazos que eles são impostos. Acontece às vezes de isso ser o dobro, ser vezes quatro, vezes dez o tamanho do esperado. Isso que a gente é gostaria de acelerar, então é necessário acelerar esses procedimentos, a burocracia no Brasil ainda é alta, e a gente é gostaria, precisamos que a sociedade se una para que os governos ou as autoridades, os órgãos locais, tenham autonomia de

fazer o certo, sem pular nenhum estágio no menor espaço de tempo possível.

GA: Pensando nesses 60 projetos que você comentou em desenvolvimento, tem alguns que você considera mais importantes?

RT: É, você sabe bem que a gente produz apenas menos de 15pc do que a gente entrega, então 85pc vem de fora, a gente importa isso. São todos prioritários. Quando a gente está nessa vulnerabilidade, não esse grau de dependência, qualquer produção no Brasil precisa ser intensificada. Todas elas são prioritárias. Sim, é prioritário produzir nitrogenados, é prioritário produzir fósforo, e prioritário é produzir potássio. Há quem diga, olha, mas a gente depende mais de potássio. Então o potássio pode ser mais prioritário? Sim, por um lado, porque a nossa dependência é maior de potássio, nós temos condição de produzir, existem projetos nessa carteira que facilitarão ser aprovados e andar a produção de potássio? Sim, existem projetos, mas eles são tão prioritários quanto também nitrogenados, porque nós temos esse problema do gás, por exemplo, e várias culturas precisam de adubos que contêm esses nitrogenados, cujo gás, seu insumo maior na sua produção, o insumo de maior custo na sua produção, de fato, está caríssimo no Brasil.

GA: No fim de agosto, o governo federal assinou um decreto para elevar as vendas de gás natural ao mercado, em uma tentativa de reduzir o preço. Como vocês enxergam os impactos desta medida para os fertilizantes?

RT: Muito importante que o governo faça todas as iniciativas para reduzir o preço do gás. O Brasil hoje compete de igual para igual com os Estados Unidos. A gente é o maior produtor do mundo, em várias culturas passamos eles. Somos os maiores exportadores do mundo em várias dessas culturas. Podia listar aqui top dez, mas não vou fazê-lo. E é injusta essa competição sob o aspecto de como um país consegue produzir mais, exportar mais e não ter um-décimo da infraestrutura dele? E o preço do gás nós estamos pagando, grosso modo, $12 a unidade, enquanto nos Estados Unidos custa $2. Então você fala assim, a quantidade de armazéns que ele tem, a quantidade de linha de trem, a quantidade de acesso a portos com calado alto e assim por diante. Quer dizer, uma concorrência que a gente perde em todos os quesitos de infraestrutura, então tudo que o governo fizer para reduzir o preço do gás é saudável para a economia brasileira.

GA: Participantes de mercado relatam haver muitos problemas neste ano com relação a acesso a crédito e inadimplência por parte de produtores rurais. Como e em que proporções a Anda avalia que esses pontos se refletirão sobre a indústria de fertilizantes?

RT: O crédito é para o produtor rural, né? Então você fala assim, o produtor está vulnerável a preços, ao momento, a conjuntura e isto é uma grande verdade. O que a gente busca, veio um Plano Safra de 500 bi, é um número razoável sobre algum aspecto, ele bate todos os recordes da série histórica. O problema de fato é que a taxa de juros no Brasil hoje é caríssima, então por mais que se esforcem em oferecer maior volume, nós estamos com taxa de juros cara. Então o que eu acho e espero que o produtor rural tenha melhores acesso a taxas menores. E aí nós precisamos, de fato, resolver os nossos problemas macroeconômicos mais densos. Então, precisa arrumar a questão fiscal, questão monetária, expectativas de inflação e só então nós vamos poder retomar a uma taxa de juros satisfatória para o nosso produtor rural.

GA: Perfeito, há dois anos, muitas empresas de fertilizantes indicaram que estavam intensificando os investimentos para atuar no mercado brasileiro, expandindo a atuação com misturadoras e se colocando próximas dos clientes finais. Na avaliação da Anda, esse cenário está mudando hoje? Para onde caminha a indústria de fertilizantes no Brasil?

RT: Eu diria que não é o cenário. São fatos, né, Gisele, cada ano mais a gente investe mais no Brasil. Nós temos vários exemplos completos, de vários players nacionais e multinacionais fazendo a aposta é de que é bom produzir no Brasil, então nós temos, é só esse ano, por exemplo, duas fábricas inauguradas pelo setor privado, ordem de grandeza de investimentos superiores a $1 bilhão e apostas concretas e que estão acontecendo, que começaram a rodar. Independente de que ainda possa ser e nós cobramos que haja um ambiente de negócios, digamos assim, mais amigável ao empresário, ao produtor de fertilizante brasileiro. Nós queremos e brigamos por isso. Pleiteamos e solicitamos este ambiente de negócio mais amigável. Mesmo assim, nós não paramos de investir. O nosso empresário tem investido, tem buscado ocupar espaço nesse mercado e tem dado retorno. São vários investimentos em vários estados que estão acontecendo neste momento e todos eles com boas expectativas de ajudar no cenário maior e desejável que é o Brasil depender um pouco menos do cenário internacional.

GA: Pensando em infraestrutura e logística, o fenômeno climático La Niña deve gerar uma seca no Arco Norte e no Sul do país, afetando o escoamento nessas regiões. Como a indústria tem atuado para reduzir esse risco?

RT: O que a gente está estudando muito, o risco climático existe, é real, o Brasil, o mundo inteiro está sujeito a isso. O mundo inteiro está sofrendo com isso. E o Brasil não é diferente, então, nós temos que lidar com essa, talvez, maior adversidade que a gente esteja tendo. O que acho que a indústria de fertilizantes tem feito com muita competência é investir nas suas pesquisas, nos seus estudos, em um tipo de adubo que consiga uma fixação maior e que seja tornar essas variâncias menos dramáticas do que foram no passado.

GA: Ainda pensando um pouquinho em logística, outro tema que surgiu muito foi a questão do gargalo logístico, que aparece todo ano, no sentido de levar o fertilizante para as lavouras. Como vocês veem essa sequência do ano, pensando em possíveis gargalos logísticos e investimentos que possam estar sendo feitos em questão de armazenagem ou infraestrutura?

RT:  Gisele, esse ano, de fato, foi uma preocupação real, quando o produtor, de novo, ele toma a decisão de postergar a compra, a janela de produção é a mesma, então a gente sabe e ele sabe, ele corre o risco de saber o seguinte: olha, a gente vai ter menos tempo para entregar a mesma coisa. Então, o que a gente entrega em 4-5 meses, quando ele posterga, talvez tenhamos que entregar em 1, 2 ou 3 meses. Como diminui isso e não tem mais armazém, não tem mais caminhão, não têm mais, tem um risco, sim, de gargalos logísticos. Como o nosso país, a gente de fato vem dobrando a safra, vem dobrando as entregas a cada década praticamente, a gente sabe que os investimentos em infraestrutura e logísticas não dobram a cada década, não vem na mesma proporção, isso cada vez mais é sim um potencial gargalo com esse comportamento conjuntural do preço nessa época que postergou a compra, sim, é um risco, é um potencial. O que aconteceu na prática até aqui, até agora? A gente tem lidado bem, a gente tem conseguido fazer as entregas até aqui, até agora, mas não dá para expurgar e falar que não existe risco. Os riscos são reais, eles existem e faz parte deste momento e dessas escolhas.

GA: Passando agora para o futuro, a Embrapa trouxe o tema do bioinsumos, de tecnologia e o papel do Brasil nesse cenário. O próprio ministro Carlos Fávaro falou de bioinsumos, como a Anda vê hoje a adoção do mercado brasileiro ao bioinsumo como alternativa ao insumo químico?

RT: Eu acho que é uma maravilha que está chegando quando a gente olha a necessidade do produtor rural. Para o produtor rural, acho que vem uma grande revolução aí, com os bio todos e eles vão ser utilizados. Eu quero crer que é assim. O químico vai continuar, o bio vem para ajudar o químico a fazer a revolução que ele talvez sozinho não conseguisse fazer. Eu citei aqui como por exemplo a fixação no solo de um de um nitrogenado. Então você fala, olha, o que os aditivos vão conseguir fazer, um fundo com bactéria, com a ciência estudando esse tipo de coisa, fixar melhor esse gás, menor evaporação, conseguir que a raiz absorva uma quantidade de elementos e de nutrientes maior, que aquilo vá para dentro da planta. Eles são os facilitadores para adicionar ao processo químico tradicional soluções que nós vamos conseguir fazer entregas mais rápidas de qualidade para o nosso produtor rural.

GA: Perfeito. Como o mercado brasileiro de fertilizantes pode trazer soluções aos desafios locais e globais?

RT: Acho que a gente sem querer falou um pouco disso. No lado global, nós temos aquela frase do Roberto Rodrigues, os quatro cavaleiros do apocalipse. Sim, nós somos as soluções do mundo se trabalharmos as nossas políticas públicas corretas. Claro que nós não estamos prontos para isso. Nós podemos ser e precisamos trabalhar. Nós precisamos, por exemplo, comentamos aqui em infraestrutura, logística, precisa ter investimentos, por que como é que a gente dobra uma safra agrícola? O Brasil está pronto para dobrar a sua safra agrícola. Mas para dobrar a nossa safra agrícola, nós precisamos de infraestrutura andando junto, porque, senão, não adianta dobrar a safra se não conseguimos distribuí-la e entregá-la na mesma velocidade, então, isso precisa caminhar junto. Precisa ter política pública e disposição do setor privado de fazer esses investimentos. Na indústria dos fertilizantes, eu diria que a nossa disposição existe. É real. Agora, aguardamos e estamos trabalhando para o Plano Nacional de Fertilizantes ser um sucesso.

GA: Muito obrigada, Tortorella.

Eu conversei com Ricardo Tortorella, diretor-executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA).

Esse e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado.

Visite a página para seguir acompanhando os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities e entender seus desdobramentos no Brasil e na América Latina. Voltaremos em breve com mais uma edição do “Falando de Mercado”. Até logo!