RC: Olá e bem-vindos ao ‘Falando de Mercado’ – uma série de podcasts trazidos semanalmente pela Argus sobre os principais acontecimentos com impacto para os setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Meu nome é Renata Cardarelli, editora adjunta da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes, e no episódio de hoje, converso com Nathalia Giannetti, repórter da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes, sobre o que está acontecendo nos mercados brasileiros de soja e milho.
Mais informações sobre esses mercados podem ser acessadas em nossa publicação diária AgriMarkets e em um suplemento semanal chinês, voltados aos mercados de grãos, oleaginosas e óleos vegetais. Além disso, nossas perspectivas e balanços estão disponíveis em nosso produto AgriMarkets Outlook com edições semanais e mensais.
Então, para começarmos, Nathalia, você poderia nos contar um pouco sobre o ritmo de farmer selling da safra de soja 2023-24?
NG: Claro, Renata. Desde a safra 2022-23, nós vemos um ritmo historicamente lento para a comercialização da soja. Esse ritmo mais lento começou por volta do fim de 2022, quando produtores acreditavam que os preços manteriam uma tendência de alta durante os meses da colheita da safra de soja 2022-23, entre janeiro e maio. Em meio à uma safra recorde no Brasil em 2022, o excesso de oferta de soja no mercado internacional pressiona os preços e desestimula agricultores a negociarem a produção agrícola.
Produtores aproveitam momentos em que cenário econômico é financeiramente favorável para venderem. Por exemplo, quando o dólar está subindo é um momento em que agricultores tendem a intensificar as vendas da produção agrícola. Mas esses cenários não possibilitam um ritmo estável de vendas.
Por exemplo, em janeiro, produtores venderam 2 milhões de toneladas durante todo o mês, enquanto as vendas totalizaram cerca de 15 milhões de toneladas em abril.
O atraso entre o ritmo de farmer selling e o que participantes de mercado consideram ideal se estreitou, mas ainda é bastante significativo, de aproximadamente 4 milhões de toneladas até o começo de julho. No fim de junho, a safra de soja 2023-24 estava com cerca de 96 milhões de toneladas negociados, o equivalente a aproximadamente 65pc da produção estimada para o ciclo.
RC: E quanto à safra 2024-25? Já há alguma informação sobre o que podemos esperar para a próxima temporada?
NG: Os números para a próxima safra de soja ainda estão um pouco incertos, Renata. Mas o que sabemos, até o momento, é que, no máximo, 20 milhões de toneladas já foram negociados até o início de julho. Se considerarmos a atual projeção do USDA para a safra 2024-25, isso totalizaria cerca de 12pc já negociados, o que está aproximadamente em linha com a comercialização da safra 2023-24 há um ano, mas atrás de uma média de 20pc para essa época do ano.
RC: Interessante, Nathalia! Com certeza, participantes de mercado devem seguir monitorando o ritmo de farmer selling da soja para observar se o atraso permanecerá. Agora, e quanto ao milho? Também há um atraso no ritmo de vendas?
NG: Sim, Renata. As negociações do milho estão mais atrasadas. Da mesma forma ao que houve com a soja, produtores esperavam que os preços continuassem subindo no início de 2023 e começaram a segurar as vendas para a safra 2022-23 durante a primeira metade no ano passado. Mas o excesso de oferta global segue pressionando os preços desde então e impede um ritmo estável de negociações.
O que torna a situação do milho ainda pior é que quando o dólar e os preços das commodities sobem internacionalmente, produtores preferem avançar com as vendas da soja, pois os preços da oleaginosa são naturalmente mais altos, atrasando as vendas de milho ainda mais.
A safra brasileira de milho inverno 2023-24 estava aproximadamente 35pc negociada até o fim de junho, abaixo dos 40pc comercializados há um ano e da média de 60pc para esta época do ano.
RC: Por esse panorama que você trouxe sobre o ritmo de farmer selling, Nathalia, fica evidente que o ritmo das vendas está bastante atrasado em relação às médias históricas. Esse atraso não deveria causar riscos de gargalos logísticos ou problemas relacionados à capacidade de armazenamento dos grãos?
NG: Exatamente, Renata. O gargalo logístico e questões relacionadas à armazenagem de grãos são problemas bastante possíveis de ocorrerem, mas, até o momento, não observamos nenhuma pressa nas vendas de soja e milho relacionadas a isso. Mas alguns participantes de mercado já esperam que agricultores devam acelerar as negociações em breve, uma vez que a colheita da soja foi finalizada mês passado e a colheita do milho está próxima do fim na maioria dos principais estados produtores.
RC: Com a colheita da soja finalizada, qual é a atual perspectiva de produção da Conab, a Companhia Nacional de Abastecimento, para a safra 2023-24?
NG: A Conab espera atualmente 147,3 milhões de toneladas de soja para a safra 2023-24. Os números para a temporada serão consolidados em setembro. Mas, até lá, é improvável que a projeção de volumes passe por muitas alterações. Claro que ainda existem algumas revisões a serem feitas, relacionadas à área plantada, ao aumento da produtividade no Centro-Oeste no fim do ciclo e à enchente que afetou o Rio Grande do Sul a partir do fim de abril.
RC: Como a atual projeção se compara com a primeira estimativa para a temporada?
NG: A safra de soja 2023-24 foi inicialmente projetada pela Conab em um recorde de 162 milhões de toneladas. Mas os cinco maiores produtores sofreram com condições climáticas adversas ao longo do último ano.
Na região Centro-Oeste, os estados de Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, todos, estiveram sob a forte influência do fenômeno climático El Niño entre dezembro e janeiro. Lembrando que Mato Grosso é o maior produtor, enquanto Goiás é o quarto e Mato Grosso do Sul ocupa a quinta colocação no ranking nacional. Em dezembro e janeiro, as temperaturas acima da média e o clima extremamente seco prejudicaram o desenvolvimento das lavouras nos três estados do Centro-Oeste.
Além disso, o Paraná, que incialmente deveria ser o segundo maior produtor de soja e agora está em terceiro lugar, sofreu com chuvas excessivas durante os meses de plantio e, depois, com uma forte estiagem durante a colheita.
E ainda mais recentemente, o Rio Grande do Sul, que está previsto para ser o segundo maior produtor de soja neste ciclo, foi atingido por enchentes sem precedentes entre o fim de abril e o início de maio. As chuvas encharcaram completamente os 25pc de áreas de soja que ainda não haviam sido colhidos na época. Algumas lavouras perderam todo o potencial produtivo.
RC: E, agora, olhando para 2024-25, o que sabemos sobre as intenções de plantio para a soja e milho? Agricultores devem priorizar soja ou milho?
NG: Para a soja, a área semeada deve crescer novamente, como tem crescido toda temporada nos últimos 17 anos. Mas essa expansão pode ser menor do que os incrementos que temos vistos nas últimas temporadas devido aos baixos preços da soja internacionalmente. Os agricultores brasileiros semearam 46 milhões de hectares em 2023-24 e as primeiras projeções para 2024-25 indicam uma área plantada em torno de 47 milhões de hectares.
Quanto o milho, ainda está cedo. Mas é provável que os preços desencorajem os produtores novamente este ano. Nós já vimos uma redução de área plantada para a primeira e segunda safras de milho em 2023-24 por causa disso. Desde então, os preços caíram ainda mais. Então, é provável que os produtores plantem menos que os quase 21 milhões de hectares desta temporada.
RC: Mas, mesmo com as condições climáticas adversas da última temporada e os preços desestimulando produtores, o Brasil colheu uma safra bastante grande nesta última temporada e deve repetir o feito novamente em 2024-25. Para onde, todos esses volumes são destinados? De onde vem a demanda?
NG: A Conab prevê que o Brasil exportará 92,4 milhões de toneladas neste ano, dos quais 75,4 milhões de toneladas já foram embarcados durante a primeira metade do ano, de acordo com a associação nacional de exportadores de cereais, a Anec.
As exportações brasileiras cresceram em relação ao primeiro semestre de 2023, o que reflete um ritmo de vendas acelerado no fim do ano passado, quando os preços para embarques no primeiro trimestre de 2024 eram favoráveis.
A China recebeu 75pc do volume embarcado e segue sendo a maior importadora de soja brasileira. O país deve continuar preferindo o produto brasileiro nos próximos meses, que está mais competitivo no momento do que a soja dos Estados Unidos. Além disso, tradings chinesas estão cautelosas em relação às eleições presidenciais dos Estados Unidos programadas para o fim do ano, devido às incertezas relacionadas aos fluxos entre China e Estados Unidos no próximo governo. Participantes de mercado reportam que a China deve receber 31 milhões de toneladas de soja entre julho e setembro, sendo a maioria desse volume de origem brasileira.
Para o milho, a Conab espera que as exportações alcancem 33,5 milhões de toneladas, enquanto a Anec estima que 9,3 milhões de toneladas tenham sido embarcados até o momento. As exportações brasileiras de milho costumam acelerar durante o segundo semestre do ano. Mas o real destaque da temporada está com a demanda doméstica. Os setores de ração animal e etanol de milho devem alcançar níveis recordes. Por exemplo, o Brasil deve produzir 6 bilhões de litros de etanol de milho na temporada 2023-24, um aumento de 36pc em relação ao ciclo passado, segundo a União Nacional do Etanol de Milho, a Unem. Então, a demanda doméstica é um ponto de atenção para este ano.
RC: Definitivamente vamos voltar a esse assunto no futuro, Nathalia! Muito obrigada por sua participação!
Esse e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado.
Visite a página para seguir acompanhando os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities e entender seus desdobramentos no Brasil e na América Latina. Voltaremos em breve com mais uma edição do “Falando de Mercado”. Até logo!