Camila Fontana: Olá pessoal! Sejam bem-vindos ao Falando de Mercado, uma série de podcast semanais da Argus Media sobre os principais acontecimentos com impacto para setores de commodities e energia no Brasil e no mundo. Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil. Estou aqui com o Bruno Castro, repórter da publicação Argus Brasil Grãos e Fertilizantes.
Hoje a gente vai falar sobre a expansão das rotas logísticas no Cone Sul com o Corredor Bioceânico de Capricórnio. Bruno, o que é esse corredor e quais setores devem ser os primeiros beneficiados?
Bruno Castro: Olá, Camila, e a todos os nossos ouvintes. Esse corredor é uma nova rota logística que vai conectar o Brasil, Paraguai, Argentina e o Chile, reduzindo o tempo médio de transporte dos produtos da região até os portos asiáticos.
Hoje, as cargas que saem do porto de Santos, que é o principal ponto de embarque de produtos agrícolas do Brasil, precisam cruzar o Canal do Panamá ou o Cabo da Boa Esperança, na África, até chegar aos principais portos da Ásia, inclusive o porto de Xangai. Esse trajeto leva em média 55 dias.
Com a nova rota, esse tempo deve ser reduzido em média para 42 dias, ou seja, uma redução de 12 dias. Essa redução diminuiria os custos de frete em 20pc, de acordo com o governo do Mato Grosso do Sul.
Esse corredor rodoviário de mais de 3 mil km vai conectar o porto brasileiro de Santos, no Oceano Atlântico, aos portos chilenos no Oceano Pacífico, cruzando o deserto do Atacama, a Cordilheira dos Andes e o Chaco paraguaio até chegar às planícies úmidas do Centro-Oeste brasileiro.
Em um primeiro momento, as exportações de produtos agrícolas devem ser beneficiadas, como carne, alimentos processados e celulose. De acordo com a Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul, a chegada de fertilizantes e insumos agrícolas da Ásia também deve ser potencializada.
CF: Você citou a Ásia. Como essa rota pode fortalecer os laços comerciais entre Mercosul e países asiáticos?
BC: É importante destacar que os países asiáticos são o destino de mais de 52pc das exportações do Mercosul e também a origem de mais de 40pc das importações.
Além da China, que é o maior parceiro comercial do Mercosul — seguida pelos Estados Unidos — a Associação das Nações do Sudeste Asiático é um importante destino para as commodities sul-americanas. Nesse grupo estão países como Camboja, Singapura, Filipinas e Indonésia.
O Mercosul tem buscado se aproximar dos países desse bloco, visto que o Sudeste Asiático tem pontos em comum com a América Latina, seja em questões da política internacional — dada sua proximidade geográfica com a China — seja no que se refere à participação na economia mundial enquanto mercados emergentes.
No âmbito doméstico, a China foi o destino de 34pc de todas as exportações agrícolas brasileiras em 2024, segundo o Ministério da Agricultura. No primeiro semestre de 2024, as exportações do Brasil para o Sudeste Asiático atingiram U$ 13,2 bilhões, um crescimento de mais de 9pc em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo a Secretaria de Comércio Exterior.
Há, inclusive, uma mobilização política no Congresso Brasileiro para formação de uma Frente Parlamentar Brasil-Asean, cujo lançamento deve contar com a presença de embaixador e diplomatas dos países do bloco do Sudeste Asiático, da China e do Japão. Portanto, é possível perceber que há disposição política do lado brasileiro para essa maior integração.
É importante ressaltar também que essa nova rota deve facilitar o escoamento de mercadorias chilenas para os mercados do Atlântico, como a União Europeia e a costa leste dos Estados Unidos.
CF: Em que pé está essa construção? Tem alguma previsão para o início das operações?
BC: Bom, no momento, o maior obstáculo para a construção da rota é a ponte binacional sobre o rio Paraguai, que vai conectar a cidade de Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, e Carmelo Peralta, no Paraguai.
As obras da ponte, que tem mais de 1 km de extensão, já avançaram mais de 65pc e devem ser concluídas no primeiro trimestre de 2026, de acordo com o Ministério de Obras Públicas e Comunicações do Paraguai.
Esse projeto, de cerca de $ 100 milhões, foi financiado pela administração da hidrelétrica de Itaipu, que os dois países compartilham. Além disso, cerca de 225k m de estradas ainda precisam ser pavimentadas do lado paraguaio.
Uma segunda ponte binacional sobre o rio Pilcomayo — entre Paraguai e Argentina — ainda está em discussão, assim como outro trecho não pavimentado de 20 km do lado argentino.
CF: Antes de encerrar, quais seriam os principais desafios essa obra?
BC: Um dos principais desafios é que o Brasil e Paraguai ainda não fazem parte da convenção TIR, que é um acordo internacional que visa promover o transporte rodoviário multilateral sem interrupções, simplificando e padronizando processos aduaneiros. Argentina, Chile, Uruguai e outros 76 países já aderiram ao acordo e a aceitação do Brasil ao documento está em discussão no Congresso Nacional desde setembro de 2024.
O governo estadual de Mato Grosso do Sul tem mobilizado seus deputados para apreciar a matéria. O Estado, que é um importante polo produtor agrícola, deve ser um dos principais beneficiados da nova rota, visto que aproximadamente 65pc das exportações sul-mato-grossenses são destinadas a países da Ásia.
Enquanto a entrada do Brasil depende somente da aprovação do congresso, o Paraguai ainda não iniciou seu processo de adesão.
A padronização dos requisitos alfandegários entre Brasil e Paraguai reduziria em 90pc o período de espera para processos de importação e exportação, segundo governo do Mato Grosso do Sul. A expectativa é que o período de espera, que hoje pode chegar até 20 dias, seja diminuído para dois dias após a adesão dos dois países ao acordo TIR.
CF: Bruno, muito obrigada por estar aqui conosco. A Argus Media vai continuar de olho nas notícias sobre o Corredor Bioceânico de Capricórnio e compartilhar com vocês.
Este e os demais episódios do nosso podcast em português estão disponíveis no site da Argus em www.argusmedia.com/falando-de-mercado. Visite a nossa página para saber mais sobre os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities.
A gente volta em breve com mais uma edição do Falando de Mercado. Até a próxima!!