A indústria de aviação brasileira está atenta às regulações para o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), enquanto o mercado doméstico aguarda o início da produção local para cumprir com o plano de mandato de mescla e com o potencial de exportação.
A Lei do Combustível do Futuro visa aumentar as mesclas obrigatórias de biocombustíveis para reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEEs) em voos domésticos no período de dez anos, a começar por 2027. O Brasil se comprometeu a aplicar um mandato de 10pc de SAF até 2037.
Os esforços do país para implementar o mandato de SAF estão alinhados às diretrizes do Esquema para Compensação e Redução de Carbono para a Aviação Internacional (Corsia, na sigla em inglês), da Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO, na sigla em inglês), que prevê a redução de emissões de GEEs em voos internacionais. O programa determina duas fases até a implementação integral das metas de redução, pensando em uma adaptação mais eficiente das companhias aéreas e dos produtores. As companhias aéreas podem aderir voluntariamente ao programa entre 2024-26. As metas compulsórias globais são implementadas entre 2027-2035, o que incentiva o uso de SAF e a compensação de créditos de carbono. A fase obrigatória abrange todos os voos internacionais, incluindo aqueles com embarque e desembarque em países não-voluntários, exceto os considerados menos desenvolvidos e os de baixa participação no tráfego aéreo global.
O SAF brasileiro é uma indústria recém-nascida com potencial para oferta de insumos, principalmente as rotas de produção envolvendo óleo de soja, etanol de milho e de cana-de-açúcar, bem como largas terras agrícolas destinadas à produção de biomassa sem a prática de mudança do uso da terra (MUT). Essa variabilidade também abre espaço para novos projetos que reutilizam terras degradadas e áreas agrícolas existentes em conformidade com os critérios de sustentabilidade da ICAO relacionados ao uso de terra e ao aprimoramento do solo.
A inserção do SAF no Brasil enfrenta obstáculos econômicos à medida que a alta volatilidade do mercado pesa sobre os investimentos de longo prazo, disse o consultor da A&M Infra, Filipe Bonaldo. Segundo o consultor, a agenda política não afetará a transição energética no país como aconteceu nos Estados Unidos sob o governo do presidente Donald Trump, uma vez que a economia do Brasil depende fortemente da agricultura e as regulações do mercado são otimistas.
Como uma potência agrícola, o Brasil oferece produção de baixo custo e múltiplas fontes para suprir as demandas internas e externas. O Brasil é o terceiro maior exportador global nos mercados agrícola e pecuário, liderando os segmentos da soja, suco de laranja e de carne, de acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CAN).
Estreia no Rio
A Vibra foi a primeira distribuidora a oferecer SAF no Brasil, antes da mescla obrigatória entrar em vigor. A empresa importou 550m³ de SAF produzido a partir de óleo de cozinha usado (UCO, na sigla em inglês), a partir da Bélgica, em janeiro.
O biocombustível está disponível para venda nas instalações da Vibra no aeroporto internacional do Rio de Janeiro após dez meses de operações logísticas. A Certificação Internacional de Sustentabilidade e Carbono (ISCC, na sigla em inglês) assegurou a validade de todas as etapas, desde a cadeia de suprimento do produto até a distribuição.
A Vibra opera em mais de 90 aeroportos no território brasileiro e representa 60pc da participação de mercado da aviação nacional através da subsidiária BR Aviation, disse o vice-presidente executivo de operações, Marcelo Bragança.
Por que tanta demora?
Por muito tempo, o setor teve dúvidas quanto à viabilidade técnica do uso de biocombustíveis na aviação, especialmente quanto à segurança, disse a gerente de meio-ambiente e transição energética da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Marcela Anselmi.
A Anac e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) seguem as regulações internacionais para o SAF ao exigirem que o biocombustível apresente semelhanças físico-químicas com o combustível fóssil de aviação para garantir a segurança das operações aéreas.
Ainda não é possível usar 100pc de SAF nos motores de aeronaves, disse Anselmi. Há um limite de 50pc de mescla que inibe a adesão ao redor do mundo, considerando as restrições técnicas que ainda precisam ser superadas.
O compromisso recente com as pautas de transição energética está incentivando a oferta de biomassa para a aviação, bem como aos modais rodoviário e marítimo, o que exige novas rotas de produção. Por exemplo, a rota alcohol-to-jet (ATJ) converte etanol em SAF, o que pode ser caro para instalar e implica alto investimento em bens de capitais.
No contexto global, o Brasil está na vanguarda da pauta SAF, considerando que a Europa e os EUA publicaram legislações relacionadas à produção e ao consumo somente nos últimos dois anos, apontou Anselmi.
Enquanto isso, a capacidade projetada de produção de SAF na América do Sul pode chegar a 1.100 m³/ano em 2030, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE).